Blog História do Ensino Superior Brasileiro, de autoria de Álaze
Gabriel. Disponível em http://historiadoensinosuperiorbrasileiro.blogspot.com.br/
HISTÓRIA DO ENSINO SUPERIOR BRASILEIRO
"O real significado
do termo "Ensino Superior" vai muito além do de ensino de terceiro
grau, como ficou popularizado principalmente após as reformas das décadas de 60
e 70. O saber superior deve ser adquirido mediante o uso de codificações,
sistemas, modelos e símbolos da semântica científica e, por isso, foge à
praticidade do dia-a-dia e se reserva aos que disponham de condições especiais
para abordá-lo. Por isso, como muitos querem, não pode ser democraticamente
acessível a todos. É um ensino, por natureza, elitista, para uma minoria
capacitada intelectual e culturalmente e não no sentido trivial de pessoas
sócio-economicamente bem postas na comunidade." (Estrutura e
Funcionamento do Ensino Superior Brasileiro - Paulo Nathanael P. Souza)
O
texto acima, apesar de discriminatório, é um retrato da história do ensino
superior no Brasil. Ao contrário das Américas Espanhola e Inglesa, que tiveram
acesso ao ensino superior já no período colonial, o Brasil teve que esperar o
final do século XIX para ver surgir as primeiras instituições culturais e
científicas deste nível, quando da vinda da Família Imperial ao país. Já a
primeira universidade surgiu somente em 1912.
Portugal
tinha apenas dois grandes objetivos quando aportou em terras brasileiras: suas
prioridades eram a fiscalização e a defesa. Durante trezentos anos, as únicas
iniciativas na área de educação vieram dos jesuítas, mais voltados para a
catequese religiosa. Os altos funcionários da Igreja e da Coroa e os filhos dos
grandes latifundiários tinham que ir à Europa para obter formação
universitária, e o destino era principalmente Coimbra. Iniciativas isoladas,
como o curso superior de Engenharia Militar no Rio de Janeiro, que surgiu no
final do século XVII, não podem ser consideradas como o ingresso do Brasil no
ensino superior já que, para todos os efeitos, era um estabelecimento
português.
Somente
em 1808, com a vinda da família real, é que surgiu o primeiro interesse de se
criar escolas médicas na Bahia e no Rio de Janeiro: em fevereiro de 1808 surge
o Colégio Médico-Cirúrgico da Bahia e em abril do mesmo ano a cadeira de
Anatomia é criada no Hospital Militar do Rio de Janeiro. Em 1810, o Príncipe
Regente assinou a carta de Lei de 4 de dezembro, criando a Academia Real
Militar da Corte, que anos mais tarde se converteria na Escola Politécnica; o
Decreto de 23/2/1808, que instituiu uma cadeira de Ciência Econômica; e o
Decreto de 12/10/1820, que organizou a Real Academia de Desenho, Pintura,
Escultura e Arquitetura Civil, depois convertida em Academia das Artes.
ENSINO ISOLADO
E PROFISSIONALIZANTE
Por
esse passado, o ensino superior se firmou com um modelo de institutos isolados
e de natureza profissionalizante. Além de elitista, já que só atendia aos
filhos da aristocracia colonial, que não podiam mais estudar na Europa, devido
ao bloqueio de Napoleão. O fato dos cursos que surgiram terem se voltado ao
ensino prático - engenharia militar e medicina - e serem ministrados em
faculdades isoladas, marcou de forma contundente o ensino superior no Brasil e
explica muitas distorções que até hoje estão marcadas em nosso sistema.
Mesmo
no século XIX, a partir da Proclamação da Independência, há um crescimento de
escolas superiores no país, mas sempre no modelo de unidades desconexas e
voltadas para a formação profissional. Algumas tentativas de criar a primeira
universidade no Brasil surgiram, como o projeto de 1843 que visava criar a
Universidade de Pedro II; o de 1847 para a criação do Visconde de Goiânia;
entre outras. Mas nenhuma saiu do papel.
A
República chega ao Brasil, mas a Constituição de 1891 omite-se em relação ao
compromisso do governo com a universidade. Em 1912, mais por forças locais,
surge a primeira universidade brasileira, no Estado do Paraná, mas que durou
somente três anos. Somente em 1920 surge a Universidade do Rio de Janeiro, hoje
Universidade Federal do Rio de Janeiro, que reunia os cursos superiores da
cidade, a saber: a Escola Politécnica, a Faculdade de Medicina e a Faculdade de
Direito - que surgira a partir da fusão da Faculdade Livre de Direito e da
Faculdade de Ciências Jurídicas e Sociais. O decreto que oficializa a
universidade é o de nº 14.343, de 7 de setembro de 1920.
De fato, a primeira universidade brasileira
permanente até nossos dias, a UFRJ, foi criada em 1920 pelo então presidente da
República, Epitácio Pessoa. Fundou-a para perpetuar, dentro da nova entidade,
os usos e costumes dos cursos isolados que viriam a lhe dar origem. Porque, na
verdade, o governo juntou vários institutos isolados, numa soma mecânica e não
integrativa, e sobre todo o conjunto colocou uma reitoria, como órgão de
comando. Novas criações surgiram: - Ministério da Educação e Saúde; - Estatuto
das Universidades Brasileiras. A universidade poderia pública (federal,
estadual ou municipal) ou livre (particular), deveria incluir três dos
seguintes cursos Direito, Medicina, Engenharia, Educação, Ciências e Letras que
seriam ligadas, por meio de uma reitoria, por vínculos administrativos,
mantendo a autonomia jurídica. - “Lei da equivalência”, equiparou os cursos
médios técnicos aos acadêmicos, possibilitando aos alunos, os mesmos direitos
de prestarem vestibular para qualquer curso universitário, um privilégio, que
antes, era exclusivo dos portadores de diplomas dos cursos médios acadêmicos. -
Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira (1961) reforçou o modelo
tradicional de instituições de ensino superior vigente no país. Um processo de
modernização sistêmica só tem lugar no início dos anos 1990, quando, então, os
empresários e o governo brasileiros voltam sua atenção para a educação, em
todos seus níveis. A evolução da universidade passou por quatro momentos: até
1950, a universidade era inexistente ou incipiente, na próxima década, cresceu
em todos os sentidos: número de instituições, de alunos, de professores,
durante os anos 70, a universidade assumiu o papel de instituição de pesquisa,
principalmente as universidades públicas, professores passaram a ter carreira
acadêmica, pós-graduação, salários bem melhores que no período anterior, foram
construídos prédios, surgiram laboratórios e bibliotecas. De 1980 em diante
iniciou-se o processo de degradação: cursos reduzidos, energia dos professores
canalizada para obter recursos e evitar a degradação dos salários, através de
greves, que nem sempre levaram ao resultado desejado. A universidade deve estar
comprometida com a qualidade de formação intelectual de seus alunos, com a
produção científica, artística, filosófica e tecnológica e com o atendimento às
necessidades, aos anseios e às expectativas da sociedade, formando
profissionais técnica e politicamente competentes, desenvolvendo soluções para
problemas locais, regionais e nacionais. A história da universidade é de
heroísmo, de períodos longos de submissão e subserviência, que serve para ilustrar,
orientar, criticar e engrandecer a função acadêmica.
O
que unia estes cursos era simplesmente a Reitoria e o Conselho Universitário.
Este modelo de universidade, onde há uma reunião de cursos isolados que têm
como ligação entre si a Reitoria, e não mecanismos acadêmicos ou
administrativos, é a base de muitas das universidades brasileiras hoje em dia,
que se constituem de instituições agregadas e não integradas. Exceção à regra
surgiu após a Revolução Constitucionalista de 1932, em São Paulo, tendo como
maior exemplo a USP - Universidade de São Paulo.
NOVO
MODELO DE ENSINO
A
USP reuniu os cursos superiores existentes no estado, tendo como enlace não a
Reitoria ou mecanismos administrativos, mas a Faculdade de Filosofia, Ciência e
Letras, que seria a instituição de saber fundamental em todas as áreas do
conhecimento humano e compensaria o isolamento das faculdades preexistentes,
que existiam independentes tanto física quanto academicamente. A Faculdade de
Filosofia, Ciência e Letras viria integrar em uma base comum os ensinamentos de
diversas áreas do saber, sendo a porta de entrada em qualquer dos outros cursos
profissionalizantes. Além disso, a proposta da USP baseava-se em três
vertentes, características da universidade moderna: ensino, pesquisa e
extensão.
Nas
décadas de 50 a 70 criaram-se universidades federais em todo o Brasil, ao menos
uma em cada estado, além de universidades estaduais, municipais e particulares.
A descentralização do ensino superior foi a vertente seguida na Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional, em vigor a partir de 1961.
Mas
a explosão do ensino superior ocorreu somente nos anos 70. Durante esta década,
o número de matrículas subiu de 300.000 (1970) para um milhão e meio (1980). A
concentração urbana e a exigência de melhor formação para a mão-de-obra
industrial e de serviços forçaram o aumento do número de vagas e o Governo,
impossibilitado de atender a esta demanda, permitiu que o Conselho Federal de
Educação aprovasse milhares de cursos novos. Mudanças também aconteceram no
exame de seleção. As provas dissertativas e orais passaram a ser de múltipla
escolha.
Esse
aumento expressivo, sem adequado planejamento, resultou em uma insuficiência de
fiscalização por parte do poder público, uma queda da qualidade de ensino e a
imagem "mercantilista" e negativa da iniciativa privado, que persiste
até hoje, ao contrário do que prega a Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Superior, de 1968 (Lei nº 5.540/68).
Na
iniciativa privada, a tendência é a de transformação dos institutos isolados em
universidades, que mantêm um estilo de funcionamento onde os cursos se mantêm
separados, sem integração acadêmica. O modelo brasileiro de universidades que
reúne institutos isolados via uma Reitoria continua a se perpetuar no país.
Fontes:
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