quarta-feira, 6 de fevereiro de 2013

ANÁLISE CRÍTICA DO ENSINO SUPERIOR BRASILEIRO CONTEMPORÂNEO



 Blog História do Ensino Superior Brasileiro, de autoria de Álaze Gabriel. Disponível em http://historiadoensinosuperiorbrasileiro.blogspot.com.br/
 

Autoria:
1 - Gilberto Teixeira. Prof. Dr. da USP.
2 - Zaira Regina Zafalon. Profa. Ms. do UNIFAI.


1 – GLOBALIZAÇÃO, EVOLUÇÃO TECNOLÓGICA E VISÃO DO MUNDO CONTEMPORÂNEO

Os recentes e intensos impactos sócio-econômicos e culturais que se propagam com uma espantosa velocidade e, graças à evolução tecnológica, afetam, em diferentes graus, as rotinas dos países do mundo, confirmam a natureza universal do atual processo de globalização da sociedade contemporânea. Este processo tem gerado mudanças que se tornam cada vez mais visíveis no cotidiano do cidadão.
Nesse sentido, a principal característica deste novo tempo é o fabuloso acúmulo da informação em todos os domínios, com surpreendente potencial de armazenamento. Embora esse conhecimento não seja produzido necessariamente na universidade, é dela que se originam os técnicos e pesquisadores que integram as instituições que estão no mercado e que trabalham com ciência e tecnologia.
Atualmente, o acúmulo de conhecimento produzido e difundido, se concentra em alguns poucos países identificados como Grupo dos Sete ou G7. De fato, 70% dos trabalhos científicos produzidos no globo aí se localizam, apesar de esse conjunto responder apenas por 14% da população mundial. A concentração da informação agrava, de modo significativo, o desequilíbrio internacional em todos os níveis. Esta simples constatação coloca em crise o papel tradicional da universidade, que é aquele relacionado à produção e divulgação do saber. A conseqüência dessas mudanças sobre as sociedades humanas tem sido denominadas como Sociedade do Conhecimento, Sociedade da Informação ou Era do Conhecimento.
Constata-se, na tentativa de aproximação da natureza do conhecimento da sociedade globalizada, a crise da matriz epistemológica cartesiana. Essa crise tem sido caracterizada como o confronto entre a concepção de que o desenvolvimento histórico do indivíduo e da sociedade se dá por meio do uso correto da razão contra aquele que afirma o fim da história, enquanto história de avanços e progressos.
O conhecimento neste novo período tem priorizado a dimensão tecnológica, em estreita sintonia com as relações de mercado. O saber e o conhecimento, no mundo globalizado, parecem perder muito de sua função de busca de sentido para a vida, o destino humano e a sociedade, para tomar-se "produto comercial de circulação" orientado pelo novo paradigma da aplicabilidade. Os paradigmas da modernidade, que ensejavam rotas previstas para o desenho do futuro humano, estão em crise. No entanto, se é evidente a crise do pressuposto epistemológico moderno, seria prematuro afirmar-se a hegemonia absoluta da pós-modernidade e do conhecimento como exclusivo processo comercial de circulação.
A nova sociedade globalizada, que prioriza o econômico e os interesses comerciais, contribui, além disso, para o estreitamento da esfera pública, e coloca em crise o tradicional papel do Estado. A esfera pública, ao se privatizar, coloca em evidência um novo "modelo de cidadania" que não se nutre mais dos valores coletivos e, consequentemente, constata-se a emergência de uma nova ética, na qual se valoriza, não mais o humano, mas o que atende aos interesses do mundo econômico.
Neste novo cenário, produção globalizada de bens, justificada pela incessante competição que associa qualidade e lucro, convive com a brutal exclusão social e desemprego especialmente naqueles países do terceiro mundo, rotulados como emergentes.
Apesar de sua pretensa hegemonia, a globalização da sociedade não consegue eliminar a "cultura regional", as minorias que cultivam identidades próprias, as realidades que se alimentam do "local", do diferente. Pode a história ser concebida como um decurso unitário? Esta noção pode ser vista como resultado da ação de grupos e classes sociais dominantes, com vistas à hegemonia. De qualquer forma, abolida a idéia de uma racionalidade central da história, podem tomar a palavra as minorias, de modo a instituir-se um mundo da diferença, de pluralidade de cultura. Esta análise salienta a necessidade dos múltiplos olhares sobre a realidade social contemporânea, o que deveria ser obrigação da universidade.
Nosso objetivo neste artigo é analisar como as Universidades Brasileiras têm reagido frente a essas mudanças e como poderiam atingir um melhor nível de qualidade no processo ensino-aprendizagem.

2 – PAPEL DA UNIVERSIDADE FRENTE À NOVA CONJUNTURA TECNOLÓGICA E GLOBALIZADA

A crescente importância do conhecimento, com sua aplicabilidade tecnológica enquanto produto comercial de circulação, e a velocidade requerida por este processo, produzem deslocamento do papel social da universidade e apresentam como resultado a desvalorização do papel dela como instituição fundamental para a produção do saber.
É preciso constatar que, no mundo globalizado, tanto nos países em desenvolvimento quanto nos ditos emergentes, a universidade não emergiu como instituição central produtora do saber. A história do aparecimento das universidades no mundo foi muito mais de depositária e defensora do saber da Igreja Católica e muito pouco como produtora de conhecimento. Nessa fase preconizava-se o conformismo, de modo a serem até punidas quaisquer idéias de inovações e mudanças. Só muitos séculos mais tarde as universidades passaram a exercer papel de produtoras do saber e a valorizar as idéias de inovação e mudança.
Por outro lado, o papel da universidade relacionado à formação profissional necessita de uma redefinição que possibilite acompanhar a evolução tecnológica que defina os contornos do exercício profissional contemporâneo, de forma a considerar a formação acadêmica como tarefa que se realiza, necessariamente, em tempos diferentes daquele em que acontecem as inovações. A este dado se acrescenta outro, o fato de que não se concebe mais exercício profissional homogêneo durante o período de inserção no mundo do trabalho. Também não se admite que a formação do profissional, qualquer que seja, deva se encerrar com sua diplomação. Desse fato nasceu a chamada Educação Continuada, também conhecida como Educação Permanente.
Do ponto de vista da Graduação, em particular, a formação para o exercício da profissão em uma era de rápidas, constantes e profundas mudanças requer, cuidadosa atenção por parte das Instituições de Ensino Superior (IES).
A decorrência comum deste processo implica adoção de nova abordagem pela IES, de modo a assegurar que seus egressos tenham adquirido a capacidade de investigação e de "aprender a aprender". Este objetivo exige o domínio dos modos de produção do saber na respectiva área, de modo a criar as condições necessárias para o processo de educação continuada.
A primeira questão que se coloca para a universidade, a fim de que ela possa redefinir seu papel, diz respeito ao modelo ou à estratégia de desenvolvimento que está priorizada. Duas alternativas extremas podem ser esboçadas aqui: o modelo concentrador, que busca aproximar o país do padrão internacional pelo fortalecimento científico-tecnológico de determinados setores da sociedade, a partir do qual se aceita a exclusão de enormes segmentos sociais e, de outro lado, o modelo includente, para o qual o desenvolvimento deve ser igualitário e centrado no princípio da cidadania como patrimônio universal, de modo que todos os cidadãos possam partilhar dos avanços alcançados. É evidente que este segundo modelo será mais difícil de ser implantado, pois terá que enfrentar as naturais resistências do ambiente acadêmico, conhecido pelo seu conservadorismo.
O conceito da autonomia universitária não aceita que a universidade seja colocada a serviço de um único segmento social. A contradição entre os múltiplos papéis da Universidade ajuda a compreender a dificuldade de atribuir-lhe simultaneamente os dois modelos. Enquanto, de um lado, ela contribui para o desenvolvimento tecnológico contemporâneo, por formar  quadros e gerar conhecimento para esta sociedade concreta, de outro, a universidade estará a serviço de uma concepção radical e universal da cidadania. Como participante do desenvolvimento tecnológico, ela será, ao mesmo tempo, crítica do modelo econômico globalizado e parceira do setor produtivo. No papel de promotora da cidadania universal, orientará parte significativa de sua produção de saber pelos interesses sociais mais amplos da sociedade.
De qualquer forma, a universidade terá de repensar a sua função social – aquela que se orienta pelo direito de todas as pessoas à uma qualidade de vida digna. Ela deverá responder não só aos desafios tecnológicos, mas também pela questão ética que diz respeito à toda amplitude da existência humana. Em resumo, parece ser fundamental que as IES busquem o equilíbrio entre a vocação técnico-científica e a vocação humanística.
O leitor certamente terá percebido a ênfase que damos ao professor universitário e a importância deste se manter capacitado como educador, isto é, com os conhecimentos e as habilidades para selecionar a mais apropriada metodologia de ensino da disciplina que irá ensinar. A farta literatura sobre Qualidade na Educação Superior focaliza o professor como o instrumento mais importante para atingir essa qualidade. Não temos nenhum receio em afirmar que a crise vivenciada pelo Ensino Superior tem como causa a incompetência e o despreparo dos docentes O ensino superior brasileiro está “perdendo o bonde da historia”.
Diante dos desafios colocados tanto pela conjuntura histórica – global e nacional – quanto pelo papel desempenhado pela educação superior não poderíamos deixar de apresentar nossa própria visão com uma proposta de um Plano de Melhoria de Qualidade do Ensino Superior, que abrange os seus dois mais importantes níveis (Graduação e Pós-Graduação). No texto que segue, são relacionadas questões que julgamos necessárias para orientar as mudanças com foco no Ensino Superior de qualidade. Na proposta gostaríamos de chamar a atenção aos pontos que julgamos de maior importância e deixaremos de focalizar detalhes de execução – como mudanças de legislação e as escolhas de estratégias – que naturalmente se farão necessárias para viabilizar o Plano.

3 – ASPECTOS TÉCNICOS E HUMANÍSTICOS QUE ENVOLVEM A EDUCAÇÃO SUPERIOR

Propor ações para o Ensino Superior no limiar do século que agora iniciamos, requer atenção aos apelos desse novo tempo, que se nos impõe sob o signo da comunicação e da informação. Ao viver na era da sociedade tecnológica, torna-se necessário rever as formas de pensar, sentir e atuar sobre essa realidade, que não se apresenta de modo linear, num continuum de causa e efeito, mas, de modo plural, numa multiplicidade e complexidade inscritas em redes e conexões, de modo a ampliar nossa inserção no mundo. Sob essa perspectiva, a convivência dos aspectos técnicos e humanísticos nos cursos de graduação adquire nova dimensão, ao desvincular-se -se do modelo moderno de humanismo autocentrado, mas com o cuidado para não assumir a postura, até certo ponto ingênua, de dar à ciência e à tecnologia condição privilegiada de atores em primeiro plano.
Historicamente, o homem atribuiu a si posição central no universo. Impôs-se como sujeito racional e agente de transformação, deveria instaurar as condições sócio-históricas para realização plena das potencialidades de sua humanidade. Ao observarmos as condições concretas da existência humana na sociedade tecnológica evidencia-se a incapacidade do sujeito em cumprir esse destino, o que pode gerar desconfiança na ideologia do progresso, diante da incerteza dos rumos da história, com a degradação da natureza e deterioração da vida social.
Pode-se salientar que as condições apontadas como efeito são as instituintes da crise do humanismo, o que obscurece seus ideais e valores pela submissão do homem à máquina.
Fundada em racionalidade cientificista, a razão se tornou instrumental, converteu-se em domínio tecnoburocrático, provocou a desumanização do homem, e, por fim, tornou-se racionalidade técnica. Sob essa ótica, na medida em que a técnica e a ciência perfazem as esferas institucionais da sociedade, as próprias instituições são transformadas.
As conseqüências do desenvolvimento científico e tecnológico, freqüentemente, têm sido tematizadas no debate intelectual contemporâneo, o que torna indispensável a reflexão sobre os princípios que devem reger o novo papel do homem nessa sociedade imagética, em que se dá a compressão do tempo e do espaço e, por vezes, as imagens substituem o objeto. Sem tratar de forma dicotômica a relação homem-máquina, é necessário dar-lhe sentido e significado, com observância do impacto das tecnologias sobre a sociedade e sobre a cultura.
Sabe-se das dificuldades de aceitação da versão do homem emancipado que administra a técnica, quando a realidade, deste início de século vem demonstrar a incapacidade humana de dar conta do que produz. Mas defende-se que se desloque o eixo da discussão para pensar a técnica não apenas como meio, como dispositivo, mas como um modo específico de inserção na realidade, como uma maneira de o homem agir e interagir no mundo.

4 – A GRADUAÇÃO E O SISTEMA EDUCACIONAL

Os desafios atuais da sociedade exigem qualificações cada vez maiores e comprometidas com uma visão holística e generalista, ao invés da restrição às especialidades como ocorreu até o final do século XX.
Os cursos de graduação não devem restringir-se à perspectiva de uma profissionalização estrita, especializada. Há que propiciar a "aquisição de competências de longo prazo”, o domínio de técnicas analíticas, de múltiplos códigos e linguagens, enfim, uma qualificação intelectual de natureza suficientemente ampla e abstrata para constituir, por sua vez, base sólida para a aquisição contínua e eficiente de conhecimentos específicos.
Diante desse cenário, cresce a importância dos cursos de graduação, a partir do momento em que se entende que a responsabilidade da IES com a formação do cidadão não pode estar restrita ao preparo do indivíduo para o exercício de uma profissão, como se isso fosse o suficiente para integrá-lo ao mundo do trabalho. Essa formação exige o compromisso com a produção de novos conhecimentos e o desenvolvimento da capacidade de adaptar-se às mudanças. Essa capacidade implica, por exemplo, em aceitar estar preparado para mudanças de carreira ao longo da vida, seja por novos interesses seja por perceber que sua carreira anterior dá sinais de desaparecer.
O incremento das novas tecnologias provoca intensas mutações profissionais, exige crescente intelectualização e enriquecimento das atividades produtivas e demanda aprendizado que envolva o manejo de informações e conhecimentos abstratos e a habilidade de lidar com grupos em atividades integradas.
Os cursos de graduação devem propiciar a oferta de referenciais teórico-básicos que possibilitem o trâmite em múltiplas direções e instrumentalizem o indivíduo para atuar de forma criativa em situações imprevisíveis. Isso implica que o aluno seja capaz, ao estar inserido no mercado de trabalho, de transferir para o mundo real conhecimentos e habilidades adquiridas em sala de aula.
Assim, a aquisição de conhecimentos deve ir além da aplicação imediata de forma a impulsionar o sujeito, em sua dimensão individual e social, a criar e responder a desafios. Em vez de ser apenas o usuário, deve ser também um agente capaz de gerar e aperfeiçoar tecnologias. Toma-se necessário desenvolver a habilidade de aprender e recriar permanentemente, para que seja retomado o sentido de uma educação continuada.
Para atender a essa exigência, a graduação necessita deixar de ser apenas o espaço da transmissão e da aquisição de informações para transformar-se no locus de construção/produção do conhecimento, em que o aluno atue como foco do processo de aprendizagem. Seria, como dizia Carl Rogers (autor de Liberdade para Aprender), não mais um processo centrado no professor – como ainda se observa em IES brasileiras –, mas centrado no aluno. Nesta abordagem, o professor passa a ser um facilitador da aprendizagem, muito diferente da postura, hoje não mais aceitável, de “dono do saber”. O problema a ser enfrentado é a interpretação correta desta mudança pelas IES e não façam dela um instrumento em que cedam, demagogicamente, aos alunos o poder de dirigir a Instituição e decidir sobre conteúdos e métodos de ensino. Essa atitude poderia resultar em graves conseqüências para a Direção da IES e até mesmo para a qualidade do processo ensino-aprendizagem.
Evidencia-se, portanto, a importância da iniciação à prática da pesquisa, ao aprender a aprender, ao desenvolvimento de processos teórico-epistemológicos de investigação da realidade, com a utilização de informações de forma seletiva. E isso só acontecerá, de forma efetiva, pela integração, em especial, da graduação com a pós-graduação.
Assim, a transição do aluno do curso de graduação para o de pós será tranqüila, sem falhas de conhecimentos essenciais e, tampouco, dificuldades de aprendizagem em um ambiente de maior liberdade, onde o aprender a aprender vai seria a estratégia que diferencia qualidade de aprendizagem e quantidade de aprendizagem.
Neste sentido, não há como funcionarem isoladamente os cursos de graduação e os programas de pós-graduação. Da mesma forma, não teria sentido isolar a Graduação dos níveis anteriores (como o Ensino Médio), no intuito de encontrar-se culpados pelas deficiências de conhecimento nos alunos recém ingressados na Graduação. O Professor Universitário teria, portanto, nos programas de pós-graduação o caminho para adquirir a perspectiva cientifica indispensável ao seu papel. Só lhe faltaria, para que possa ser considerado profissional da educação, adquirir conhecimentos e habilidades de ensinar. Mas, infelizmente, inexiste qualquer preocupação sobre esse vazio na formação dos professores quer sejam do poder publico (MEC, Conselho Nacional de Educação e CAPES), quer da comunidade acadêmica (IES e Professores).
Também é inaceitável que a comunidade acadêmica permaneça comodamente alheia ao problema da qualidade do ensino superior e atribua a responsabilidade ao poder publico. Afinal, a qualidade do ensino-aprendizagem é responsabilidade de todos elementos que fazem parte do Sistema Nacional de Educação Superior.

5 - O PÚBLICO E O PRIVADO NA EDUCAÇÃO SUPERIOR

Um projeto voltado ao ensino de graduação não pode ser prerrogativa de um dos segmentos que compõem o sistema nacional de ensino superior, sejam eles de natureza privada ou pública. As exigências requeridas por este projeto pedagógico, fundado na indissociabilidade do ensino, da pesquisa e da extensão, são de grande complexidade, tanto as relativas ao exercício da docência, quanto às relacionadas às condições físicas nas quais o processo se dá.
Um sistema nacional de graduação articula-se com as experiências históricas acumuladas. Ao caracterizarmos recente a criação da universidade brasileira, seu segmento público, aquele financiado pelo Estado, é, em geral, pioneiro no país, e, tornou-se referência de qualidade para todo o sistema nacional, especialmente no campo da pesquisa cientifica.
Lamentavelmente, essa referência de qualidade das IES públicas está em declínio, por vários motivos:

(a)  o corporativismo de seus docentes, que defendem justas reivindicações salariais, mas que combatem, ao invés de colaborar com qualquer política ou iniciativa que vise eficiência e qualidade do ensino;
(b)  a redução crescente das verbas alocadas para as IES públicas aliada à falta de criatividade de seus gestores em obter recursos do setor privado;
(c)  a má administração das IES públicas por concentrarem tanto a direção dos assuntos acadêmicos quanto a direção dos assuntos administrativo-financeiros e, este ultimo, não entregue a profissionais;
(d)  o protecionismo das agências oficiais em relação às IES públicas (especialmente as federais), que deixam de sofrer sanções ou críticas sobre seus resultados negativos, pois, se as fizerem, essas agências oficiais serão acusadas de invasão da autonomia da IES;
(e)  a falta de recursos financeiros para contratar professores substitutos de docentes aposentados, o que resulta em cancelamento de disciplinas ou aumento do tamanho de turmas, com graves conseqüências sobre a qualidade do ensino-aprendizagem;
(f)   as freqüentes e demoradas greves, quase sempre por reivindicações salariais, que resultam em redução do período letivo e grande prejuízo da qualidade do processo ensino-aprendizagem. A conseqüência última é um profissional com formação deficiente.


Em se tratando das IES privadas podem ser listadas as seguintes questões que merecem ações saneadoras:

(a)  pouca ou nenhuma preocupação com a capacitação e aperfeiçoamento de seus docentes na área pedagógica;
(b)  pouca ou nenhuma ação para motivar seus docentes em cursarem mestrado ou doutorado;
(c)  criação de cursos (com aprovação do MEC) cuja oferta e/ou mercado de trabalho estão saturados ou em declínio;
(d)  altos níveis de inadimplência e muito pouca criatividade para negociar com os alunos inadimplentes;
(e)  ausência de plano de carreira docente;
(f)   pouco interesse em manter um sistema de avaliação de desempenho dos docentes que sirva para estimulá-los na correção de deficiências e melhoria da qualidade do ensino-aprendizagem. É muito comum esse mecanismo ser criado para servir a objetivos punitivos e de afastamento, o que poderá resultar em seqüelas nas relações da direção com o corpo docente;
(g)  preocupação, pela mantenedora, com lucros grandiosos e o desinteresse em investir em ações que se destinem a melhoria da qualidade do ensino-aprendizagem.

Deve ficar óbvio que esse conjunto de observações sobre as IES públicas e privadas não se aplicam integralmente ao universo das instituições. Com certeza, em cada categoria, existem IES que são exceções e até podem servir de exemplo a forma como conduzem as deficiências relacionadas acima. Também deve ser ressaltado que muitas das deficiências podem ser difíceis de sanar por falta de compreensão ou incompetência por parte das agências públicas federais que deveriam aprovar e/ou colaborar com qualquer ação que objetive melhoria de qualidade no ensino superior.

6 - A CAPACITAÇÃO DOS PROFESSORES DO ENSINO SUPERIOR

Depois de expostos os itens acima entendemos como evidente, para a concretização das propostas deste Plano, a necessidade de um novo perfil docente. Este docente teria, necessariamente, formação científica na sua área de conhecimento, conforme estabelece a LDB, instrumentalizada pela pós-graduação stricto sensu.
O aprender e o recriar permanentemente, ou seja, o "aprender a aprender", conceito pedagógico derivado dos novos desafios da sociedade contemporânea, não se esgotam no campo da introdução à ciência ou nos métodos de reprodução do saber. Todo o saber é contextualizado historicamente, assim como toda atividade profissional humana se dá em um contexto social, de forma a situar o papel da universidade entre os interesses da sociedade tecnológica e a contingência ética da necessidade de integração de todos ao patrimônio dos bens e da cultura que uma sociedade produz.
O conceito de aprender a aprender resulta dos estudos de Piaget, considerado o pai do Construtivismo e um dos maiores psicólogos da aprendizagem do século XX. Foi o método do construtivismo que explicou como o ser humano aprende de forma eficiente. Para utilizar-se deste método o aluno terá que aprender a aprender, ou seja, ser aprendiz autônomo, auxiliado pelo professor, no papel de orientador e facilitador da aprendizagem. Tanto os aspectos teóricos como as aplicações práticas desse processo são objeto da atual visão da Pedagogia e da Didática. Estamos no momento de as Agências Oficiais e as IES perceberem que, para ser professor, deve-se exigir conhecimento e domínio de habilidades pedagógicas, essenciais ao bom desempenho docente. Para que as IES reconheçam essa necessidade, a iniciativa deveria partir das agências oficiais reguladores, no sentido de regular, criar políticas e estabelecer diretrizes. Entretanto, nada impede que as IES promovam, isolada ou conjuntamente, programas de capacitação docente. Essa atitude poderia ser capaz de deflagrar uma estratégia de colaboração entre o Poder Público e as IES privadas e públicas.
Da parte das Agências Oficiais há que se abandonar a postura autoritária e assumir outra, formuladora de políticas e orientadora de atividades de implantação das políticas. Não seria eticamente aceitável que elementos que exerçam atividades de consultoria ou direção de órgãos oficiais tenham vinculo com IES, como já ocorreu outrora. A formulação de políticas públicas educacionais devem focar, essencialmente, ações destinadas à melhoria da qualidade do processo ensino-aprendizagem.
Queixas freqüentes das IES tem sido quanto à postura autoritária nas seguintes situações:

(a)  falta de diálogo com a comunidade acadêmica quando da realização de mudanças de procedimentos ou estudos para alterar legislação;
(b)  decisão, subjetiva e arbitrária por parte das comissões reguladoras, ao avaliarem cursos de graduação e programas de pós-graduação.

7 - O PAPEL DA LDB

Neste ponto do artigo analisaremos a possibilidade de a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei 9394/96) ser o instrumento legal para viabilizar este plano e indicar as possíveis alterações que nela seriam necessárias. Embora não seja nosso objetivo analisar a história do Ensino Superior no Brasil, é importante destacar a importância da LDB (Lei 9394/96) nessa evolução histórica.
As legislações anteriores sobre Educação Superior foram, de alguma forma, inovadoras e implantaram reformas. Algumas foram alvo de críticas por trazer inovações ao ambiente acadêmico, reconhecido como conservador. Estas legislações procuravam modernizar o Ensino Superior para adaptá-lo às mudanças sociais, políticas e econômicas que impactavam a sociedade brasileira. Um fator que tem influenciado a Educação no Brasil é a inconstância do regime político dominante, que oscila entre o totalitarismo (pleno ou disfarçado) e a democracia, impregnada de autoritarismo. Como a Educação é fortemente influenciada pelo regime político é fácil compreender o processo de insatisfação.
A prova dessa inconstância da legislação está no cronograma histórico das LDB’s, a saber: Lei 4024/61; Lei 5540/68; Lei 5692/71; Lei 9394/96 (em vigor). Assim, entre 61 e 96, a duração das LDB’s variou de 4 até 25 anos.
A LDB de 1996 foi resultado de um longo processo legislativo na Câmara de Deputados, com início em 1988 (Projeto 1258/88). Este Projeto, por ter sofrido 1.275 destaques, foi arquivado e retomado, no Senado, como Projeto 67/1990, finalmente aprovado como Lei 9394/96. Vale constar que até os mais críticos da atual LDB são unânimes em reconhecer que ela é muito avançada para a época em que foi sancionada.
Feitas essas considerações sobre a história das LDB’s, analisaremos a forma em que foram tratados, pela LDB de 1996,  os assuntos que,  particularmente, interessa-nos neste artigo:

1 - Ao tratar de Responsabilidades dos Docentes (Art.13) aponta a necessidade de conhecimentos e habilidades na área pedagógica. Está explicito e, portanto, claro, que este deve ser pré-requisito para que o docente possa elaborar o Planejamento Pedagógico de sua disciplina e participar do mesmo Plano no nível da IES (ambos considerados exigência legal).

2 - Ao tratar da formação de professores para os níveis de ensino fundamental e médio, a LDB exige que o professor tenha um curso superior na área de Educação (artigos 61, 62, 63) e, para a docência no ensino superior exige curso de Mestrado ou Doutorado (art. 66). O texto da lei não faz qualquer menção acerca da necessidade de que deva ser incluída disciplina cujo conteúdo programático seja Pedagogia e Didática. Entretanto, na regulamentação dos cursos Lato Sensu, é obrigatória a disciplina Metodologia do Ensino Superior. Temos, portanto, no ensino superior brasileiro, professores que podem ser categorizados como amadores da educação pois não lhes foi ensinado conteúdos de disciplinas como Pedagogia, Didática ou Metodologia do Ensino. Enquanto isso, para ensinar crianças e adolescentes temos profissionais da Educação. Poderia ser considerado, neste caso, exercício ilegal da profissão, dado o não cumprimento da LDB, artigo 13, no qual consta como premente a Pedagogia e a Didática para qualquer professor, independente do nível que seja analisado. Os Programas de Mestrado e Doutorado, tanto no Brasil como nas Universidades estrangeiras, são considerados como uma capacitação para a pesquisa científica e aprofundamento dos conhecimentos numa área específica. A variedade de estratégias organizacionais e de conteúdos programáticos adotados em países como Estados Unidos, Inglaterra, França, Austrália e Alemanha poderiam servir como referência para uma solução brasileira. Isso não significa, deixemos claro, copiar modelos internacionais, mas, analisar soluções adotadas com vistas à busca de melhoria na qualidade do processo de ensino-aprendizagem. Objetivamente, naqueles países citados, já está consolidada a idéia de que o professor universitário deva dominar a pedagogia e didática em sua área de conhecimento. Ao retomarmos a LDB, percebe-se que é possível afirmar que, embora em seu artigo 13 tenha sido explicitada a importância da capacitação em pedagogia, a mesma lei, no artigo 66, coloca os títulos de Mestre e Doutor como suficientes e necessários para transformar mestres e doutores em professores.

3 - O artigo 52, incisos II e III da LDB, também merece análise, pois se for mantido o texto original há de trazer conseqüências certamente não desejadas pelo legislador. Consta no inciso II deste artigo que as IES deverão ter um terço do corpo docente com titulação acadêmica de mestrado ou doutorado. Entretanto, há um confrontamento com o exposto acima: exigência da titulação para ser professor universitário. Assim posto, os dois terços que não estão titulados não poderiam ser professores universitários. Em outra passagem, no inciso III, a exigência é de que se tenha um terço do corpo docente em tempo integral. Essa exigência, se tomada ao pé da letra em algumas áreas, especialmente em humanas, não permitirá aquisição de conhecimentos no mercado de trabalho e, conseqüentemente, prejudicará a prática profissional, imprescindível para ensinar. Este professor seria de contexto meramente teórico. A exigência de professores em tempo integral tem como justificativa a necessidade de o professor dedicar-se à pesquisa. Entretanto, por má interpretação, exige-se isso por toda a carreira acadêmica. Para conciliar pesquisa e ensino de qualidade seria razoável estabelecer um limite, em anos, em que o docente esteja em tempo integral.








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