Blog História do Ensino Superior Brasileiro, de autoria de Álaze
Gabriel. Disponível em http://historiadoensinosuperiorbrasileiro.blogspot.com.br/
Autoria:
1 - Gilberto
Teixeira. Prof. Dr. da USP.
2 - Zaira Regina Zafalon. Profa. Ms. do UNIFAI.
1 –
GLOBALIZAÇÃO, EVOLUÇÃO TECNOLÓGICA E VISÃO DO MUNDO CONTEMPORÂNEO
Os recentes e intensos impactos sócio-econômicos e
culturais que se propagam com uma espantosa velocidade e, graças à evolução
tecnológica, afetam, em diferentes graus, as rotinas dos países do mundo,
confirmam a natureza universal do atual processo de globalização da sociedade
contemporânea. Este processo tem gerado mudanças que se tornam cada vez mais
visíveis no cotidiano do cidadão.
Nesse sentido, a principal característica deste
novo tempo é o fabuloso acúmulo da informação em todos os domínios, com surpreendente
potencial de armazenamento. Embora esse conhecimento não seja produzido
necessariamente na universidade, é dela que se originam os técnicos e
pesquisadores que integram as instituições que estão no mercado e que trabalham
com ciência e tecnologia.
Atualmente, o acúmulo de conhecimento produzido e
difundido, se concentra em alguns poucos países identificados como Grupo dos
Sete ou G7. De fato, 70% dos trabalhos científicos produzidos no globo aí se
localizam, apesar de esse conjunto responder apenas por 14% da população
mundial. A concentração da informação agrava, de modo significativo, o
desequilíbrio internacional em todos os níveis. Esta simples constatação coloca
em crise o papel tradicional da universidade, que é aquele relacionado à
produção e divulgação do saber. A conseqüência dessas mudanças sobre as
sociedades humanas tem sido denominadas como Sociedade do Conhecimento,
Sociedade da Informação ou Era do Conhecimento.
Constata-se, na tentativa de aproximação da
natureza do conhecimento da sociedade globalizada, a crise da matriz
epistemológica cartesiana. Essa crise tem sido caracterizada como o confronto
entre a concepção de que o desenvolvimento histórico do indivíduo e da
sociedade se dá por meio do uso correto da razão contra aquele que afirma o fim
da história, enquanto história de avanços e progressos.
O conhecimento neste novo período tem priorizado a
dimensão tecnológica, em estreita sintonia com as relações de mercado. O saber
e o conhecimento, no mundo globalizado, parecem perder muito de sua função de
busca de sentido para a vida, o destino humano e a sociedade, para tomar-se
"produto comercial de circulação" orientado pelo novo paradigma da
aplicabilidade. Os paradigmas da modernidade, que ensejavam rotas previstas
para o desenho do futuro humano, estão em crise. No entanto, se é evidente a
crise do pressuposto epistemológico moderno, seria prematuro afirmar-se a
hegemonia absoluta da pós-modernidade e do conhecimento como exclusivo processo
comercial de circulação.
A nova sociedade globalizada, que prioriza o
econômico e os interesses comerciais, contribui, além disso, para o
estreitamento da esfera pública, e coloca em crise o tradicional papel do
Estado. A esfera pública, ao se privatizar, coloca em evidência um novo
"modelo de cidadania" que não se nutre mais dos valores coletivos e,
consequentemente, constata-se a emergência de uma nova ética, na qual se
valoriza, não mais o humano, mas o que atende aos interesses do mundo
econômico.
Neste novo cenário, produção globalizada de bens,
justificada pela incessante competição que associa qualidade e lucro, convive
com a brutal exclusão social e desemprego especialmente naqueles países do
terceiro mundo, rotulados como emergentes.
Apesar de sua pretensa hegemonia, a globalização da
sociedade não consegue eliminar a "cultura regional", as minorias que
cultivam identidades próprias, as realidades que se alimentam do
"local", do diferente. Pode a história ser concebida como um decurso
unitário? Esta noção pode ser vista como resultado da ação de grupos e classes
sociais dominantes, com vistas à hegemonia. De qualquer forma, abolida a idéia
de uma racionalidade central da história, podem tomar a palavra as minorias, de
modo a instituir-se um mundo da diferença, de pluralidade de cultura. Esta análise
salienta a necessidade dos múltiplos olhares sobre a realidade social
contemporânea, o que deveria ser obrigação da universidade.
Nosso objetivo neste artigo é analisar como as
Universidades Brasileiras têm reagido frente a essas mudanças e como poderiam
atingir um melhor nível de qualidade no processo ensino-aprendizagem.
2 – PAPEL
DA UNIVERSIDADE FRENTE À NOVA CONJUNTURA TECNOLÓGICA E GLOBALIZADA
A crescente importância do conhecimento, com sua
aplicabilidade tecnológica enquanto produto comercial de circulação, e a
velocidade requerida por este processo, produzem deslocamento do papel social
da universidade e apresentam como resultado a desvalorização do papel dela como
instituição fundamental para a produção do saber.
É preciso constatar que, no mundo globalizado,
tanto nos países em desenvolvimento quanto nos ditos emergentes, a universidade
não emergiu como instituição central produtora do saber. A história do
aparecimento das universidades no mundo foi muito mais de depositária e
defensora do saber da Igreja Católica e muito pouco como produtora de
conhecimento. Nessa fase preconizava-se o conformismo, de modo a serem até
punidas quaisquer idéias de inovações e mudanças. Só muitos séculos mais tarde
as universidades passaram a exercer papel de produtoras do saber e a valorizar
as idéias de inovação e mudança.
Por outro lado, o papel da universidade relacionado
à formação profissional necessita de uma redefinição que possibilite acompanhar
a evolução tecnológica que defina os contornos do exercício profissional
contemporâneo, de forma a considerar a formação acadêmica como tarefa que se
realiza, necessariamente, em tempos diferentes daquele em que acontecem as
inovações. A este dado se acrescenta outro, o fato de que não se concebe mais
exercício profissional homogêneo durante o período de inserção no mundo do
trabalho. Também não se admite que a formação do profissional, qualquer que
seja, deva se encerrar com sua diplomação. Desse fato nasceu a chamada Educação
Continuada, também conhecida como Educação Permanente.
Do ponto de vista da Graduação, em particular, a
formação para o exercício da profissão em uma era de rápidas, constantes e
profundas mudanças requer, cuidadosa atenção por parte das Instituições de
Ensino Superior (IES).
A decorrência comum deste processo implica adoção
de nova abordagem pela IES, de modo a assegurar que seus egressos tenham
adquirido a capacidade de investigação e de "aprender a aprender".
Este objetivo exige o domínio dos modos de produção do saber na respectiva área,
de modo a criar as condições necessárias para o processo de educação
continuada.
A primeira questão que se coloca para a
universidade, a fim de que ela possa redefinir seu papel, diz respeito ao
modelo ou à estratégia de desenvolvimento que está priorizada. Duas
alternativas extremas podem ser esboçadas aqui: o modelo concentrador, que
busca aproximar o país do padrão internacional pelo fortalecimento
científico-tecnológico de determinados setores da sociedade, a partir do qual
se aceita a exclusão de enormes segmentos sociais e, de outro lado, o modelo
includente, para o qual o desenvolvimento deve ser igualitário e centrado no
princípio da cidadania como patrimônio universal, de modo que todos os cidadãos
possam partilhar dos avanços alcançados. É evidente que este segundo modelo
será mais difícil de ser implantado, pois terá que enfrentar as naturais
resistências do ambiente acadêmico, conhecido pelo seu conservadorismo.
O conceito da autonomia universitária não aceita
que a universidade seja colocada a serviço de um único segmento social. A
contradição entre os múltiplos papéis da Universidade ajuda a compreender a
dificuldade de atribuir-lhe simultaneamente os dois modelos. Enquanto, de um
lado, ela contribui para o desenvolvimento tecnológico contemporâneo, por
formar quadros e gerar conhecimento para esta sociedade concreta, de
outro, a universidade estará a serviço de uma concepção radical e universal da
cidadania. Como participante do desenvolvimento tecnológico, ela será, ao mesmo
tempo, crítica do modelo econômico globalizado e parceira do setor produtivo.
No papel de promotora da cidadania universal, orientará parte significativa de
sua produção de saber pelos interesses sociais mais amplos da sociedade.
De qualquer forma, a universidade terá de repensar
a sua função social – aquela que se orienta pelo direito de todas as pessoas à
uma qualidade de vida digna. Ela deverá responder não só aos desafios
tecnológicos, mas também pela questão ética que diz respeito à toda amplitude
da existência humana. Em resumo, parece ser fundamental que as IES busquem o
equilíbrio entre a vocação técnico-científica e a vocação humanística.
O leitor certamente terá percebido a ênfase que
damos ao professor universitário e a importância deste se manter capacitado como
educador, isto é, com os conhecimentos e as habilidades para selecionar a mais
apropriada metodologia de ensino da disciplina que irá ensinar. A farta
literatura sobre Qualidade na Educação Superior focaliza o professor como o
instrumento mais importante para atingir essa qualidade. Não temos nenhum
receio em afirmar que a crise vivenciada pelo Ensino Superior tem como causa a
incompetência e o despreparo dos docentes O ensino superior brasileiro está
“perdendo o bonde da historia”.
Diante dos desafios colocados tanto pela conjuntura
histórica – global e nacional – quanto pelo papel desempenhado pela educação
superior não poderíamos deixar de apresentar nossa própria visão com uma
proposta de um Plano de Melhoria de Qualidade do Ensino Superior, que abrange
os seus dois mais importantes níveis (Graduação e Pós-Graduação). No texto que
segue, são relacionadas questões que julgamos necessárias para orientar as
mudanças com foco no Ensino Superior de qualidade. Na proposta gostaríamos de
chamar a atenção aos pontos que julgamos de maior importância e deixaremos de
focalizar detalhes de execução – como mudanças de legislação e as escolhas de
estratégias – que naturalmente se farão necessárias para viabilizar o Plano.
3 –
ASPECTOS TÉCNICOS E HUMANÍSTICOS QUE ENVOLVEM A EDUCAÇÃO SUPERIOR
Propor ações para o Ensino Superior no limiar do
século que agora iniciamos, requer atenção aos apelos desse novo tempo, que se
nos impõe sob o signo da comunicação e da informação. Ao viver na era da
sociedade tecnológica, torna-se necessário rever as formas de pensar, sentir e
atuar sobre essa realidade, que não se apresenta de modo linear, num continuum
de causa e efeito, mas, de modo plural, numa multiplicidade e complexidade
inscritas em redes e conexões, de modo a ampliar nossa inserção no mundo. Sob
essa perspectiva, a convivência dos aspectos técnicos e humanísticos nos cursos
de graduação adquire nova dimensão, ao desvincular-se -se do modelo moderno de
humanismo autocentrado, mas com o cuidado para não assumir a postura, até certo
ponto ingênua, de dar à ciência e à tecnologia condição privilegiada de atores
em primeiro plano.
Historicamente, o homem atribuiu a si posição
central no universo. Impôs-se como sujeito racional e agente de transformação,
deveria instaurar as condições sócio-históricas para realização plena das
potencialidades de sua humanidade. Ao observarmos as condições concretas da
existência humana na sociedade tecnológica evidencia-se a incapacidade do
sujeito em cumprir esse destino, o que pode gerar desconfiança na ideologia do
progresso, diante da incerteza dos rumos da história, com a degradação da
natureza e deterioração da vida social.
Pode-se salientar que as condições apontadas como
efeito são as instituintes da crise do humanismo, o que obscurece seus ideais e
valores pela submissão do homem à máquina.
Fundada em racionalidade cientificista, a razão se
tornou instrumental, converteu-se em domínio tecnoburocrático, provocou a
desumanização do homem, e, por fim, tornou-se racionalidade técnica. Sob essa
ótica, na medida em que a técnica e a ciência perfazem as esferas
institucionais da sociedade, as próprias instituições são transformadas.
As conseqüências do desenvolvimento científico e
tecnológico, freqüentemente, têm sido tematizadas no debate intelectual
contemporâneo, o que torna indispensável a reflexão sobre os princípios que
devem reger o novo papel do homem nessa sociedade imagética, em que se dá a
compressão do tempo e do espaço e, por vezes, as imagens substituem o objeto. Sem
tratar de forma dicotômica a relação homem-máquina, é necessário dar-lhe
sentido e significado, com observância do impacto das tecnologias sobre a
sociedade e sobre a cultura.
Sabe-se das dificuldades de aceitação da versão do
homem emancipado que administra a técnica, quando a realidade, deste início de
século vem demonstrar a incapacidade humana de dar conta do que produz. Mas
defende-se que se desloque o eixo da discussão para pensar a técnica não apenas
como meio, como dispositivo, mas como um modo específico de inserção na
realidade, como uma maneira de o homem agir e interagir no mundo.
4 – A
GRADUAÇÃO E O SISTEMA EDUCACIONAL
Os desafios atuais da sociedade exigem
qualificações cada vez maiores e comprometidas com uma visão holística e
generalista, ao invés da restrição às especialidades como ocorreu até o final
do século XX.
Os cursos de graduação não devem restringir-se à
perspectiva de uma profissionalização estrita, especializada. Há que propiciar
a "aquisição de competências de longo prazo”, o domínio de técnicas
analíticas, de múltiplos códigos e linguagens, enfim, uma qualificação
intelectual de natureza suficientemente ampla e abstrata para constituir, por
sua vez, base sólida para a aquisição contínua e eficiente de conhecimentos
específicos.
Diante desse cenário, cresce a importância dos
cursos de graduação, a partir do momento em que se entende que a
responsabilidade da IES com a formação do cidadão não pode estar restrita ao
preparo do indivíduo para o exercício de uma profissão, como se isso fosse o
suficiente para integrá-lo ao mundo do trabalho. Essa formação exige o
compromisso com a produção de novos conhecimentos e o desenvolvimento da
capacidade de adaptar-se às mudanças. Essa capacidade implica, por exemplo, em
aceitar estar preparado para mudanças de carreira ao longo da vida, seja por
novos interesses seja por perceber que sua carreira anterior dá sinais de
desaparecer.
O incremento das novas tecnologias provoca intensas
mutações profissionais, exige crescente intelectualização e enriquecimento das
atividades produtivas e demanda aprendizado que envolva o manejo de informações
e conhecimentos abstratos e a habilidade de lidar com grupos em atividades
integradas.
Os cursos de graduação devem propiciar a oferta de
referenciais teórico-básicos que possibilitem o trâmite em múltiplas direções e
instrumentalizem o indivíduo para atuar de forma criativa em situações
imprevisíveis. Isso implica que o aluno seja capaz, ao estar inserido no
mercado de trabalho, de transferir para o mundo real conhecimentos e
habilidades adquiridas em sala de aula.
Assim, a aquisição de conhecimentos deve ir além da
aplicação imediata de forma a impulsionar o sujeito, em sua dimensão individual
e social, a criar e responder a desafios. Em vez de ser apenas o usuário, deve
ser também um agente capaz de gerar e aperfeiçoar tecnologias. Toma-se
necessário desenvolver a habilidade de aprender e recriar permanentemente, para
que seja retomado o sentido de uma educação continuada.
Para atender a essa exigência, a graduação
necessita deixar de ser apenas o espaço da transmissão e da aquisição de
informações para transformar-se no locus de construção/produção do
conhecimento, em que o aluno atue como foco do processo de aprendizagem. Seria,
como dizia Carl Rogers (autor de Liberdade para Aprender), não mais um processo
centrado no professor – como ainda se observa em IES brasileiras –, mas
centrado no aluno. Nesta abordagem, o professor passa a ser um facilitador da
aprendizagem, muito diferente da postura, hoje não mais aceitável, de “dono do
saber”. O problema a ser enfrentado é a interpretação correta desta mudança
pelas IES e não façam dela um instrumento em que cedam, demagogicamente, aos
alunos o poder de dirigir a Instituição e decidir sobre conteúdos e métodos de
ensino. Essa atitude poderia resultar em graves conseqüências para a Direção da
IES e até mesmo para a qualidade do processo ensino-aprendizagem.
Evidencia-se, portanto, a importância da iniciação
à prática da pesquisa, ao aprender a aprender, ao desenvolvimento de processos
teórico-epistemológicos de investigação da realidade, com a utilização de
informações de forma seletiva. E isso só acontecerá, de forma efetiva, pela
integração, em especial, da graduação com a pós-graduação.
Assim, a transição do aluno do curso de graduação
para o de pós será tranqüila, sem falhas de conhecimentos essenciais e,
tampouco, dificuldades de aprendizagem em um ambiente de maior liberdade, onde
o aprender a aprender vai seria a estratégia que diferencia qualidade de aprendizagem
e quantidade de aprendizagem.
Neste sentido, não há como funcionarem isoladamente
os cursos de graduação e os programas de pós-graduação. Da mesma forma, não
teria sentido isolar a Graduação dos níveis anteriores (como o Ensino Médio),
no intuito de encontrar-se culpados pelas deficiências de conhecimento nos
alunos recém ingressados na Graduação. O Professor Universitário teria,
portanto, nos programas de pós-graduação o caminho para adquirir a perspectiva
cientifica indispensável ao seu papel. Só lhe faltaria, para que possa ser
considerado profissional da educação, adquirir conhecimentos e habilidades de
ensinar. Mas, infelizmente, inexiste qualquer preocupação sobre esse vazio na
formação dos professores quer sejam do poder publico (MEC, Conselho Nacional de
Educação e CAPES), quer da comunidade acadêmica (IES e Professores).
Também é inaceitável que a comunidade acadêmica
permaneça comodamente alheia ao problema da qualidade do ensino superior e
atribua a responsabilidade ao poder publico. Afinal, a qualidade do
ensino-aprendizagem é responsabilidade de todos elementos que fazem parte do
Sistema Nacional de Educação Superior.
5 - O
PÚBLICO E O PRIVADO NA EDUCAÇÃO SUPERIOR
Um projeto voltado ao ensino de graduação não pode
ser prerrogativa de um dos segmentos que compõem o sistema nacional de ensino
superior, sejam eles de natureza privada ou pública. As exigências requeridas
por este projeto pedagógico, fundado na indissociabilidade do ensino, da
pesquisa e da extensão, são de grande complexidade, tanto as relativas ao
exercício da docência, quanto às relacionadas às condições físicas nas quais o
processo se dá.
Um sistema nacional de graduação articula-se com as
experiências históricas acumuladas. Ao caracterizarmos recente a criação da
universidade brasileira, seu segmento público, aquele financiado pelo Estado,
é, em geral, pioneiro no país, e, tornou-se referência de qualidade para todo o
sistema nacional, especialmente no campo da pesquisa cientifica.
Lamentavelmente, essa referência de qualidade das
IES públicas está em declínio, por vários motivos:
(a) o corporativismo de seus docentes, que defendem
justas reivindicações salariais, mas que combatem, ao invés de colaborar com
qualquer política ou iniciativa que vise eficiência e qualidade do ensino;
(b) a redução crescente das verbas alocadas para as IES
públicas aliada à falta de criatividade de seus gestores em obter recursos do
setor privado;
(c) a má administração das IES públicas por
concentrarem tanto a direção dos assuntos acadêmicos quanto a direção dos
assuntos administrativo-financeiros e, este ultimo, não entregue a
profissionais;
(d) o protecionismo das agências oficiais em relação às
IES públicas (especialmente as federais), que deixam de sofrer sanções ou
críticas sobre seus resultados negativos, pois, se as fizerem, essas agências
oficiais serão acusadas de invasão da autonomia da IES;
(e) a falta de recursos financeiros para contratar
professores substitutos de docentes aposentados, o que resulta em cancelamento
de disciplinas ou aumento do tamanho de turmas, com graves conseqüências sobre
a qualidade do ensino-aprendizagem;
(f) as freqüentes e demoradas greves, quase sempre por
reivindicações salariais, que resultam em redução do período letivo e grande
prejuízo da qualidade do processo ensino-aprendizagem. A conseqüência última é
um profissional com formação deficiente.
Em se tratando das IES privadas podem ser listadas
as seguintes questões que merecem ações saneadoras:
(a) pouca ou nenhuma preocupação com a capacitação e
aperfeiçoamento de seus docentes na área pedagógica;
(b) pouca ou nenhuma ação para motivar seus docentes em
cursarem mestrado ou doutorado;
(c) criação de cursos (com aprovação do MEC) cuja
oferta e/ou mercado de trabalho estão saturados ou em declínio;
(d) altos níveis de inadimplência e muito pouca
criatividade para negociar com os alunos inadimplentes;
(e) ausência de plano de carreira docente;
(f) pouco interesse em manter um sistema de avaliação
de desempenho dos docentes que sirva para estimulá-los na correção de
deficiências e melhoria da qualidade do ensino-aprendizagem. É muito comum esse
mecanismo ser criado para servir a objetivos punitivos e de afastamento, o que
poderá resultar em seqüelas nas relações da direção com o corpo docente;
(g) preocupação, pela mantenedora, com lucros
grandiosos e o desinteresse em investir em ações que se destinem a melhoria da
qualidade do ensino-aprendizagem.
Deve ficar óbvio que esse conjunto de observações
sobre as IES públicas e privadas não se aplicam integralmente ao universo das
instituições. Com certeza, em cada categoria, existem IES que são exceções e
até podem servir de exemplo a forma como conduzem as deficiências relacionadas
acima. Também deve ser ressaltado que muitas das deficiências podem ser
difíceis de sanar por falta de compreensão ou incompetência por parte das
agências públicas federais que deveriam aprovar e/ou colaborar com qualquer
ação que objetive melhoria de qualidade no ensino superior.
6 - A
CAPACITAÇÃO DOS PROFESSORES DO ENSINO SUPERIOR
Depois de expostos os itens acima entendemos como
evidente, para a concretização das propostas deste Plano, a necessidade de um
novo perfil docente. Este docente teria, necessariamente, formação científica
na sua área de conhecimento, conforme estabelece a LDB, instrumentalizada pela
pós-graduação stricto sensu.
O aprender e o recriar permanentemente, ou seja, o
"aprender a aprender", conceito pedagógico derivado dos novos
desafios da sociedade contemporânea, não se esgotam no campo da introdução à
ciência ou nos métodos de reprodução do saber. Todo o saber é contextualizado
historicamente, assim como toda atividade profissional humana se dá em um
contexto social, de forma a situar o papel da universidade entre os interesses
da sociedade tecnológica e a contingência ética da necessidade de integração de
todos ao patrimônio dos bens e da cultura que uma sociedade produz.
O conceito de aprender a aprender resulta dos
estudos de Piaget, considerado o pai do Construtivismo e um dos maiores
psicólogos da aprendizagem do século XX. Foi o método do construtivismo que
explicou como o ser humano aprende de forma eficiente. Para utilizar-se deste
método o aluno terá que aprender a aprender, ou seja, ser aprendiz autônomo,
auxiliado pelo professor, no papel de orientador e facilitador da aprendizagem.
Tanto os aspectos teóricos como as aplicações práticas desse processo são
objeto da atual visão da Pedagogia e da Didática. Estamos no momento de as
Agências Oficiais e as IES perceberem que, para ser professor, deve-se exigir
conhecimento e domínio de habilidades pedagógicas, essenciais ao bom desempenho
docente. Para que as IES reconheçam essa necessidade, a iniciativa deveria
partir das agências oficiais reguladores, no sentido de regular, criar
políticas e estabelecer diretrizes. Entretanto, nada impede que as IES
promovam, isolada ou conjuntamente, programas de capacitação docente. Essa
atitude poderia ser capaz de deflagrar uma estratégia de colaboração entre o
Poder Público e as IES privadas e públicas.
Da parte das Agências Oficiais há que se abandonar
a postura autoritária e assumir outra, formuladora de políticas e orientadora
de atividades de implantação das políticas. Não seria eticamente aceitável que
elementos que exerçam atividades de consultoria ou direção de órgãos oficiais
tenham vinculo com IES, como já ocorreu outrora. A formulação de políticas
públicas educacionais devem focar, essencialmente, ações destinadas à melhoria
da qualidade do processo ensino-aprendizagem.
Queixas freqüentes das IES tem sido quanto à
postura autoritária nas seguintes situações:
(a) falta de diálogo com a comunidade
acadêmica quando da realização de mudanças de procedimentos ou estudos para
alterar legislação;
(b) decisão, subjetiva e arbitrária por parte
das comissões reguladoras, ao avaliarem cursos de graduação e programas de
pós-graduação.
7 - O
PAPEL DA LDB
Neste ponto do artigo analisaremos a possibilidade
de a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei 9394/96) ser o
instrumento legal para viabilizar este plano e indicar as possíveis alterações
que nela seriam necessárias. Embora não seja nosso objetivo analisar a história
do Ensino Superior no Brasil, é importante destacar a importância da LDB (Lei
9394/96) nessa evolução histórica.
As legislações anteriores sobre Educação Superior
foram, de alguma forma, inovadoras e implantaram reformas. Algumas foram alvo
de críticas por trazer inovações ao ambiente acadêmico, reconhecido como
conservador. Estas legislações procuravam modernizar o Ensino Superior para
adaptá-lo às mudanças sociais, políticas e econômicas que impactavam a
sociedade brasileira. Um fator que tem influenciado a Educação no Brasil é a
inconstância do regime político dominante, que oscila entre o totalitarismo
(pleno ou disfarçado) e a democracia, impregnada de autoritarismo. Como a
Educação é fortemente influenciada pelo regime político é fácil compreender o
processo de insatisfação.
A prova dessa inconstância da legislação está no
cronograma histórico das LDB’s, a saber: Lei 4024/61; Lei 5540/68;
Lei 5692/71; Lei 9394/96 (em vigor). Assim, entre 61 e 96, a
duração das LDB’s variou de 4 até 25 anos.
A LDB de 1996 foi resultado de um longo processo
legislativo na Câmara de Deputados, com início em 1988 (Projeto 1258/88).
Este Projeto, por ter sofrido 1.275 destaques, foi arquivado e retomado, no
Senado, como Projeto 67/1990, finalmente aprovado como Lei 9394/96.
Vale constar que até os mais críticos da atual LDB são unânimes em reconhecer
que ela é muito avançada para a época em que foi sancionada.
Feitas essas considerações sobre a história das
LDB’s, analisaremos a forma em que foram tratados, pela LDB de 1996, os
assuntos que, particularmente, interessa-nos neste artigo:
1 - Ao tratar de Responsabilidades dos Docentes
(Art.13) aponta a necessidade de conhecimentos e habilidades na área
pedagógica. Está explicito e, portanto, claro, que este deve ser pré-requisito
para que o docente possa elaborar o Planejamento Pedagógico de sua disciplina e
participar do mesmo Plano no nível da IES (ambos considerados exigência legal).
2 - Ao tratar da formação de professores para os
níveis de ensino fundamental e médio, a LDB exige que o professor tenha um
curso superior na área de Educação (artigos 61, 62, 63) e, para a docência no
ensino superior exige curso de Mestrado ou Doutorado (art. 66). O texto da lei
não faz qualquer menção acerca da necessidade de que deva ser incluída
disciplina cujo conteúdo programático seja Pedagogia e Didática. Entretanto, na
regulamentação dos cursos Lato Sensu, é obrigatória a disciplina
Metodologia do Ensino Superior. Temos, portanto, no ensino superior brasileiro,
professores que podem ser categorizados como amadores da educação pois não lhes
foi ensinado conteúdos de disciplinas como Pedagogia, Didática ou Metodologia
do Ensino. Enquanto isso, para ensinar crianças e adolescentes temos
profissionais da Educação. Poderia ser considerado, neste caso, exercício
ilegal da profissão, dado o não cumprimento da LDB, artigo 13, no qual consta
como premente a Pedagogia e a Didática para qualquer professor,
independente do nível que seja analisado. Os Programas de Mestrado e Doutorado,
tanto no Brasil como nas Universidades estrangeiras, são considerados como uma
capacitação para a pesquisa científica e aprofundamento dos conhecimentos numa
área específica. A variedade de estratégias organizacionais e de conteúdos
programáticos adotados em países como Estados Unidos, Inglaterra, França,
Austrália e Alemanha poderiam servir como referência para uma solução
brasileira. Isso não significa, deixemos claro, copiar modelos internacionais,
mas, analisar soluções adotadas com vistas à busca de melhoria na qualidade do
processo de ensino-aprendizagem. Objetivamente, naqueles países citados, já
está consolidada a idéia de que o professor universitário deva dominar a
pedagogia e didática em sua área de conhecimento. Ao retomarmos a LDB,
percebe-se que é possível afirmar que, embora em seu artigo 13 tenha sido
explicitada a importância da capacitação em pedagogia, a mesma lei, no artigo
66, coloca os títulos de Mestre e Doutor como suficientes e necessários para
transformar mestres e doutores em professores.
3 - O artigo 52, incisos II e III da LDB, também
merece análise, pois se for mantido o texto original há de trazer conseqüências
certamente não desejadas pelo legislador. Consta no inciso II deste artigo que
as IES deverão ter um terço do corpo docente com titulação acadêmica de
mestrado ou doutorado. Entretanto, há um confrontamento com o exposto acima:
exigência da titulação para ser professor universitário. Assim posto, os dois
terços que não estão titulados não poderiam ser professores universitários. Em
outra passagem, no inciso III, a exigência é de que se tenha um terço do corpo
docente em tempo integral. Essa exigência, se tomada ao pé da letra em algumas
áreas, especialmente em humanas, não permitirá aquisição de conhecimentos no
mercado de trabalho e, conseqüentemente, prejudicará a prática profissional,
imprescindível para ensinar. Este professor seria de contexto meramente
teórico. A exigência de professores em tempo integral tem como justificativa a
necessidade de o professor dedicar-se à pesquisa. Entretanto, por má
interpretação, exige-se isso por toda a carreira acadêmica. Para conciliar
pesquisa e ensino de qualidade seria razoável estabelecer um limite, em anos,
em que o docente esteja em tempo integral.
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